sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Medicina em excesso?

John McKnight

Face à grande explosão dos custos na área médica, líderes trabalhistas questionam se devem continuar a trocar ganho real por benefícios médicos. O frustrado executivo da General Motors anunciou ter sua companhia pago uma quantia mais elevada pelo seguro de saúde do que pelo aço para produzir automóveis. O presidente da maior organização de seguro-saúde confessou que o principal problema de saúde nos Estados Unidos é como limitar os custos da medicina.

A princípio, o governo federal estabeleceu diretrizes encorajando a auto-regulamentação do setor médico. Essas medidas não deram resultado. Os custos aumentaram, apesar dos esforços administrativos e profissionais para limitar os gastos do sistema. Temos, porém, cada vez mais provas de que os serviços médicos têm pouco a ver com a saúde da população.

O economista Victor Fuchs reconhece o impacto dos novos conhecimentos médicos sobre a saúde é mínimo e conclui que “atualmente, a melhoria da saúde do povo americano depende, principalmente, daquilo que ele faz ou deixa de fazer por si mesmo.” E Anne Somers escreveu que “a maioria dos problemas de saúde importantes do país — acidentes de carros, todas as formas de dependência de drogas, inclusive o alcoolismo, doenças sexualmente transmissíveis, obesidade, muitos tipos de câncer, a maioria das doenças cardíacas e dos casos de mortalidade infantil — não pode ser atribuída a falhas no atendimento (médico), mas, sim, às condições de vida, ignorância ou irresponsabilidade dos doentes. Nenhuma quantidade de verbas adicionais, nem mesmo a reorganização do sistema, terão muito efeito sobre esse problema”.

Cinco caminhos

Face a esse dilema, a medicina americana criou novas possibilidades, novos caminhos.

O primeiro é a erradicação do resíduo. Existem algumas doenças que afligem uma pequena parcela da população. Um grande esforço é orquestrado para derrotar a poliomelite, o Lúpus eritematoso e a síndrome de Tourettes.

O segundo caminho é a possibilidade “biônica” — intervenções cirúrgicas para reconstruir o corpo humano. Invenções médicas mecânicas incluem hoje coronárias, implantes de mama e substituição das articulações, o transplante de órgãos e operações envolvendo mudança de sexo.

A terceira possibilidade é a manipulação genética. As pesquisas sobre clones e DNA sugerem possibilidades inimagináveis de criação de novos seres humanos. O exame do líquido amniótico permite a eliminação dos indivíduos psicológica ou sexualmente “indesejáveis”. Prometem o aperfeiçoamento da raça humana para permitir um futuro mais “humano”.

O quarto caminho é a possibilidade de redefinir a condição humana. Calvície, velhice, gravidez, menopausa e crianças hiperativas estão sendo definidas como males possíveis de serem corrigidos por intervenção médica. Há pouco tempo, foi descoberto um tratamento para a “síndrome da dona de casa cansada”. As possibilidades a serem exploradas são ilimitadas se a medicina consegue levar as pessoas a pensar que suas vidas são problemas médicos.

Por fim, cada uma dessas novas fronteiras médicas cria novos dilemas. À medida que avançamos nesses novos caminhos, surgem inúmeras questões sobre ética, custos, justiças e iatrogenia (doença provocada por erro médico). Cada questão requer novos recursos profissionais para corrigir os efeitos colaterais.

A promessa é uma ilusão

Em suma, a resposta da medicina para a crise dos custos é conduzir-nos em direção a novas fronteiras. A promessa que nos aguarda é:

erradicar as doenças;

reconstruir o corpo humano;

recriar a humanidade;

oferecer terapias para viver;

criar novos métodos para corrigir novos dilemas.

A oferta é, sem dúvida, interessante. O que a medicina está nos oferecendo não é apenas a eliminação da doença, mas o aperfeiçoamento da vida. Uma oferta difícil de recusar!

Entretanto, até mesmo os melhores e mais brilhantes profissionais da medicina sabem que a promessa não passa de uma ilusão. Os jornais médicos estão repletos de angustiantes artigos reconhecendo que, em sua ilimitada pretensão, a medicina tornou-se um falso deus que afasta o povo do caminho não-médico, que conduziria a uma sociedade sadia.

Resta, então, saber por que a sociedade continua fazendo um investimento tão catastrófico dos recursos nacionais.

Uma resposta diz que o povo é mal informado ou muito supersticioso e inclinado a seguir falsos deuses. Existe, também, outra explicação — a medicina moderna cresce porque suas principais funções são econômicas e políticas e não terapêuticas.

Tudo indica que nossa saúde, hoje, requer mudanças importantes no relacionamento individual, social, econômico e ambiental. Não requer investimento na medicina. Tais mudanças exigem alterações revolucionárias nas estruturas institucionais, nos sistema de valores, nas relações de poder e no estilo de vida. Obviamente, aqueles que lucram com as condições atuais não apoiariam esse “desenvolvimento da saúde”.

Como um dos principais sistemas educacionais da sociedade, a medicina ensina duas lições fundamentais:

quem sabe resolver os problemas é o especialista tecnicamente habilitado. A mensagem da propaganda médica é que precisamos acreditar no profissional. Ele compreende os problemas. Ele conhece as respostas;

consequentemente, o bem-estar dos indivíduos depende de sua capacidade de serem clientes. Você vai progredir e se desenvolver à medida que receber cuidados médicos. Você é consequência do atendimento — não daquilo que você faz.

A lição ensina como resposta “certa” que as pessoas encontrem seu potencial humano na qualidade de clientes, consumindo produtos profissionais. A possibilidade da população mudar uma sociedade doente por meio de sua própria ação é uma resposta “errada”, dada por cidadãos que não conseguem aprender a lição do sistema.

Em segundo lugar, a medicina oferece placebos para os indivíduos que ainda pensam em engajar-se em ações populares para mudar a ordem política que determina a saúde. Para os alienados, irados ou frustrados pelo impacto nocivo causado pela ordem atual, a medicina oferece uma quantidade monumental de medicamentos psicotrópicos que ajudam multidões a suportar a dor.

Em terceiro lugar, à medida que a sociedade investe nas cinco novas fronteiras da medicina, aprende que depende da máxima conquista profissional-tecnológica. Nossa saúde fica na expectativa dos peritos que trabalham com seus microscópios. Em vez de criarmos uma nova ordem sadia, acreditamos que precisamos usar nossos limitados recursos para pesquisa e desenvolvimento.

E, por fim, temos a habilidade da medicina moderna de ofuscar o perigo de uma sociedade tecnológica. Sua promessa de destruir a morte pelas mãos dos tecnocratas confirma uma visão mundial que valoriza o desenvolvimento tecnológico acima de tudo. Em uma sociedade deteriorada, devido ao crescimento ilimitado de sistemas tecnológicos, a medicina nos cega para a causa da nossa morte.
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Fonte: Resumo de artigo publicado na revista “Resurgence”

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