A terapia celular começou a ser estudada muito tempo atrás, história que foi contada recentemente no anúncio do Prêmio Nobel de Medicina de 2012 a John B. Gurdon e Shinya Yamanaka.
Com o potencial de usar uma célula-tronco saudável para substituir
outra célula danificada, a terapia celular pode ter inúmeras aplicações,
como reconstruir membros perdidos ou sarar o músculo cardíaco após um
infarto.
Células-tronco são células estaminais pluripotentes presentes em um
embrião nos primeiros dias após a concepção, e podem ser transformadas
em quaisquer células existentes no organismo adulto: células nervosas,
musculares, do fígado, etc.
Baseado nessa explicação resumida, você já deve ter percebido que
essas células estaminais não são exatamente as coisas mais fáceis de se
conseguir. Se o aborto já é um tema polêmico por si só, “violar” um
embrião para estudar células-tronco foi o foco da controvérsia por um bom tempo, até que ficou provado que
células adultas poderiam ser “reprogramadas” para “voltarem” a serem
“células estaminais”, capazes de formar qualquer tecido (essa foi a
descoberta que deu o Nobel aos pesquisadores).
Ainda assim, a pesquisa com humanos precisa ser cautelosa. No caso do
Nobel, os estudos científicos vencedores foram feitos com animais. Usar
cobaias vivas poderia mesmo levantar questões éticas e preocupações, já
os mortos… já estão mortos.
Cadáveres têm células vivas
Muito tempo depois de nossos sinais vitais cessarem, pequenas bolsas de células vivem por dias, até semanas.
Um estudo neurocientífico do Instituto Lieber para o Desenvolvimento
Cerebral em Baltimore (EUA) conseguiu colher essas células vivas dos
escalpos e dos cérebros de cadáveres humanos (mortos há dias) e
reprogramá-las em células-tronco.
Em outras palavras: pessoas mortas podem produzir células vivas que
podem ser convertidas em qualquer célula ou tecido do corpo. Sendo
assim, esse incrível avanço poderia ajudar a tornar disponível de uma
vez por todas a terapia celular.
Além disso, o estudo pode lançar luz sobre uma variedade de
transtornos mentais, como autismo, esquizofrenia e transtorno bipolar,
que podem decorrer de problemas com o desenvolvimento cerebral.
A pesquisa
Células maduras podem ser induzidas a se tornarem células imaturas, conhecidas como células estaminais pluripotentes.
Pesquisas anteriores já haviam mostrado que este mesmo processo pode ser realizado com os chamados fibroblastos, retirados da pele de cadáveres humanos.
Os fibroblastos são as células mais comuns do tecido conjuntivo nos
animais, e sintetizam a matriz extracelular, as “bases” complexas entre
as células.
Fibroblastos coletados de cadáveres podem ser reprogramados em
células-tronco pluripotentes induzidas, utilizando produtos químicos
conhecidos como fatores de crescimento que estão relacionados com a
atividade das células-tronco.
As células reprogramadas podem então desenvolver-se em uma grande
variedade de tipos de células, incluindo neurônios encontrados no
cérebro e na medula espinhal.
Mas há uma dificuldade: bactérias e fungos na pele podem causar
estragos no cultivo das células em laboratórios, tornando o processo
complicado.
Nesse estudo, os cientistas coletaram fibroblastos dos escalpos e dos
cérebros de 146 doadores humanos de cérebro para estudo científico, e
cresceram células-tronco pluripotentes induzidas a partir deles.
Os corpos estavam mortos de 10 horas a dois dias antes dos cientistas
coletarem as amostras, e os cadáveres tinham sido mantidos sob
refrigeração no necrotério, mas não congelados.
Os pesquisadores descobriram que os fibroblastos retirados do
revestimento do cérebro ou da dura-máter eram 16 vezes mais propensos a
crescerem com sucesso do que os retirados do couro cabeludo. Isto era
esperado, uma vez que o couro cabeludo é propenso à contaminação por
fungos e bactérias.
Surpreendentemente, as células do couro cabeludo se proliferaram mais
e cresceram mais rapidamente do que as células da dura-máter. “Isso faz
sentido – a pele está em constante renovação, enquanto esse processo na
dura-máter é muito mais lento”, disse Thomas Hyde, neurologista e
neurocientista que participou do estudo.
Aplicações
Segundo os pesquisadores, cadáveres podem fornecer tecidos do
coração, cérebro e outros órgãos para estudo que os pesquisadores não
podem obter de forma segura a partir de pessoas vivas.
“Por exemplo, podemos comparar os neurônios derivados de fibroblastos
com neurônios reais do mesmo indivíduo”, disse Hyde. “Isso nos diz quão
confiável um determinado método para derivar neurônios a partir de
fibroblastos é. Isso pode ser crucial se, por exemplo, quisermos criar
neurônios que produzem dopamina para tratar alguém com Parkinson”.
Estudar como as células-tronco pluripotentes induzidas se desenvolvem
em vários tecidos diferentes também pode lançar luz sobre distúrbios
causados por problemas de desenvolvimento.
“Estamos muito interessados nos principais distúrbios
neuropsiquiátricos como esquizofrenia, transtorno bipolar, autismo e
retardo mental”, disse Hyde. “Ao compreender o que se passa de errado
com as células cerebrais nestes indivíduos, poderíamos ajudar a
corrigi-las”.[LiveScience, ABCNews]
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