25/05/2012
Como a indústria
farmacêutica conseguiu que um terço da população dos Estados Unidos tome
antidepressivos, estatinas, e estimulantes? Vendendo doenças como depressão,
colesterol alto e refluxo gastrointestinal. Marketing impulsionado pela oferta,
também conhecido como “existe um medicamento – precisa-se de uma doença e de
pacientes”.
Não apenas povoa a sociedade de hipocondríacos viciados em remédios, mas desvia os laboratórios do que deveria ser seu papel essencial: desenvolver remédios reais para problemas médicos reais.
Claro que nem
todas as doenças são boas para tanto. Para que uma enfermidade torne-se campeã
de vendas, ela deve:
(1) existir de verdade, mas ser constatada num diagnóstico que tem margem de manobra, não dependendo de um exame preciso;
(2) ser
potencialmente séria, com “sintomas silenciosos” que “só pioram” se a doença
não for tratada;
(3) ser “pouco reconhecida”, “pouco relatada” e com “barreiras” ao tratamento;
(4) explicar problemas de saúde que o paciente teve anteriormente;
(5) precisar de uma nova droga cara que não possui equivalente genérico.
(3) ser “pouco reconhecida”, “pouco relatada” e com “barreiras” ao tratamento;
(4) explicar problemas de saúde que o paciente teve anteriormente;
(5) precisar de uma nova droga cara que não possui equivalente genérico.
Aqui estão algumas
potenciais doenças da moda, que a indústria farmacêutica gostaria que você desenvolvesse
em 2012:
DÉFICIT DE
ATENÇÃO COM HIPERATIVIDADE EM ADULTOS (DDAH) : Problemas cotidianos rotulados como “depressão”
impulsionaram os laboratórios nas últimas duas décadas. Você não estava triste,
bravo, com medo, confuso, de luto ou até mesmo sentindo-se explorado. Você
estava deprimido, e existe uma pílula para isso. Mas a depressão chegou a um
ápice, como a dieta Atkins e Macarena. Com sorte, existe o transtorno de
déficit de atenção com hiperatividade (DDAH) em adultos. Ele dobrou em mulheres
de 45 a 65 anos e triplicou em homens e mulheres com 20 a 44 anos, de acordo
com o Wall Street Journal.
Assim como a
depressão, a DDAH em adultos é uma categoria que pode englobar tudo.
Adultos com DDAH
são normalmente “menos responsáveis, confiáveis, engenhosos, focados,
autoconfiantes, e eles encontram dificuldades para definir, estabelecer e
propor objetivos pessoais significativos”, diz um artigo escrito pelo dr.
Joseph Biederman, psiquiatra infantil de Harvard, que leva os créditos por
colocar “disfunção bipolar pediátrica” no mapa. Eles “mostram tendências de ser
mais fechados, intolerantes, críticos, inúteis, e oportunistas” e “tendem a não
considerar direitos e sentimentos de outras pessoas”, diz o artigo, numa frase
que poderia ser usada por muitas pessoas para definir seus cunhados. Adultos
com DDAH terão dificuldade em se manter em um emprego e pioram se não forem
tratados, diz WebMD, apontando para o seguindo requisito para as doenças
campeãs de venda – sintomas que se agravam sem medicação. “Adultos com DDAH
podem ter dificuldade em seguir orientações, lembrar informações,
concentrar-se, organizar tarefas ou completar o trabalho no prazo”, de
acordo com o site, cujo parceiro original era Eli Lilly.
Como as empresas
farmacêuticas conseguiram fazer com que cinco milhões de crianças, e agora
talvez seus pais, tomem remédios para DDAH? Anúncios em telas de 9 metros por
7, quatro vezes por hora na Times Square não vão fazer mal. Perguntam: “Não
consegue manter o foco? Não consegue ficar parado? Seu filho pode ter DDAH?”
(Aposto que ninguém teve problemas em se focar neles!).
Porém, convencer
adultos que eles não estão dormindo pouco, nem entediados, mas têm DDAH é
apenas metade da batalha. As transnacionais farmacêuticas também têm que
convencer crianças que cresceram com o diagnóstico de DDAH a não pararem de
tomar a medicação, diz Mike Cola, da Shire (empresa que produz os medicamentos
para DDAH: Intuniv, Addreall XR, Vyvanse e Daytrana). “Nós sabemos que perdemos
um número significativo de pacientes com mais ou menos vinte anos, pois saem do
sistema por não irem mais ao pediatra”.
Um anúncio da
Shire na Northwestern University diz “eu lembro de ser uma criança com DDAH. Na
verdade, eu ainda tenho”, a frase está escrita em uma foto de Adam Levine,
vocalista do Maroon 5. “É sua DDAH. Curta” era a mensagem subliminar. (O
objetivo seria: “continue doente”?).
Claro, pilhar
crianças (ou qualquer um, na verdade) não é muito difícil. Por que outra razão
traficantes de metanfetamina dizem que “a primeira dose é grátis”? Mas a
indústria está tão empenhada em manter o mercado pediátrico de DDAH que criou
cursos para médicos. Alguns exemplos: “Identificando, diagnosticando e
controlando DDAH em estudantes”. Ou “DDAH na faculdade: procurar e receber
cuidado durante a transição da infância para a idade adulta”.
Para
assegurar-se de que ninguém pense que a DDAH é uma doença inventada, WebMD
mostra ressonâncias magnéticas coloridas de cérebros de pessoas normais e de
pacientes com DDAH (ao lado de um anúncio de Vyvanse). Mas é duvidoso se as
duas imagens são realmente diferentes, diz o psiquiatra Dr. Phillip Sinaikin,
autor de Psychiatryland. E mesmo que forem, isso não prova nada.
O ponto central do
problema é que simplesmente não existe um entendimento definitivo de como a
atividade neural está relacionada à consciência subjetiva, a antiga relação não
muito clara entre corpo e mente”, Sinaikin contou ao AlterNet. “Não avançamos
muito além da frenologia, e esse artigo do WebMD é simplesmente o pior tipo
de manipulação da indústria farmacêutica a fim de vender seus produtos
extremamente caros. Nesse caso, um esforço desesperado da Shire para manter
uma parte do mercado quando o Addreall tiver versão genérica”.
ARTRITE
REUMATÓIDE : A Artrite
Reumatoide (AR) é uma doença séria e perigosa. Mas os supressores do sistema
imunológico que a indústria farmacêutica oferece como alternativa – Remicade,
Enbrel, Humira e outros – também são. Enquanto a AR ataca os tecidos do
corpo, levando à inflamação das articulações, tecidos adjacentes e órgãos,
os supressores imunológicos podem abrir uma brecha para câncer, infecções
letais e tuberculose.
Em 2008, a agência
norte-americana para alimentação e medicamentos (FDA) anunciou que 45 pessoas
que tomavam Humira, Enbrel, Humicade e Cimzia morreram por doenças causadas por
fungos, e investigou a relação do Humira com linfoma, leucemia e melanoma em
crianças. Esse ano, a FDA avisou que as drogas podem causar “um raro tipo de
câncer nas células sanguíneas brancas” em jovens, e o Journal of the American
Medical Association (JAMA) advertiu o aparecimento de “infecções potencialmente
fatais por legionela e listeria”. Medicamentos que suprem o sistema imunológico
também são perigosos para os bolsos. Uma injeção de Remicade pode custar US$
2.500; o suprimento de um mês de Enbrel custa US$ 1.500; o custo anual do
Humira é de US$ 20 mil.
Há alguns anos, a
AR era diagnosticada com base na presença do “fator reumatóide” e inflamações.
Mas, graças ao marketing guiado pela oferta da indústria farmacêutica, bastam
hoje, para o diagnóstico, enrijecimento e dor. (Atletas e pessoas que nasceram
entes de 1970, entrem na fila, por favor).
Além do espaço de
manobra para o diagnóstico e um bom nome, a AR possui outros requisitos das
doenças campeãs de vendas. “Só vai piorar” se não for tratada, diz WebMD, e é
frequentemente “subdiagnosticada” e pouco relatada, diz Heather Mason, da
Abbott, porque “as pessoas costumam não saber o que têm, por algum tempo”. Uma
doença tão perigosa que o tratamento custa US$20 mil por ano, mas que é tão
súbita que você pode não saber que tem? AR desponta como uma doença da moda.
FIBROMIALGIA : Outra doença pouco relatada é a fibromialgia,
caracterizada dores generalizadas e inexplicadas no corpo. Fibromialgia é
“quase a definição de uma necessidade médica não atendida”, diz Ian Read, da
Pfizer, que fabrica a primeira droga aprovada para fibromialgia, o medicamento
anticonvulsivo Lyrica. A Pfizer doou US$ 2,1 milhões a grupos sem fins
lucrativos em 2008 para “educar” médicos sobre a fibromialgia e financiou
anúncios de serviço da indústria farmacêutica que descreviam os sintomas e
citavam a droga. Hoje, a Lyrica lucra US$ 3 bilhões por ano. Mesmo
assim, a Lyrica concorre com Cymbalta, o primeiro antidepressivo aprovado para
fibromialgia. A Eli Lilly propôs o uso de Cymbalta para a “dor” física da
depressão, em uma campanha chamada “depressão machuca” antes da aprovação do
tratamento para fibromialgia. O tratamento de pacientes com fibromialgia com
Lyrica ou Cymbalta custa cerca de US$10 mil, segundo diários médicos. A
indústria farmacêutica e Wall Street podem estar felizes com os medicamentos
para fibromialgia, mas os pacientes não. No site de avaliação de medicamentos,
askapatient.com, pacientes que usam Cymbalta relatam calafrios, problemas
maxilares, “pings” elétricos em seus cérebros, e problemas nos olhos. Nesse
ano, quatro pacientes relataram a vontade de se matar, um efeito colateral
frequente do Cymbalta. Usuários de Lyrica relatam no askapatient perda de
memória, confusão, ganho extremo de peso, queda de cabelo, capacidade de
dirigir automóveis comprometida, desorientação, espasmos e outros ainda piores.
Alguns pacientes tomam os dois medicamentos.
DISFUNÇÕES
DO SONO: Insônia no meio
da noite. Disfunções do sono são uma mina de ouro para os laboratórios
porque todo mundo dorme – ou assiste TV, quando não consegue. Para agitar o
mercado de insônia, as corporações criaram subcategorias de insônia, como
crônica, aguda, transitória, inicial, de início tardio, causada pela menopausa,
e a grande categoria de sono não reparador. Nesse outono [primavera no
hemisfério Sul], as apareceu uma nova versão do Ambien para insônia “no meio da
noite”, chamado Intermezzo – ainda que Ambien seja, paradoxalmente, indutor de
momentos conscientes durante o sono. As pessoas “acordam” em um blackout do
Ambien e andam, falam, dirigem, fazem ligações e comem.
Muitos ficaram
sabendo desse efeito do Ambien quando Patrick Kennedy, ex-parlamentar de Rhode
Island, dirigiu até Capitol Hill para “votar” às 2h45min da manhã em 2006, sob
efeito do remédio, e bateu seu Mustang. Mas foi comer sob o efeito do Ambien
que trouxe a pior discussão sobre o medicamento. Pessoas em forma acordavam no
meio de montanhas de embalagens de pizza, salgadinhos e sorvete – cujo conteúdo
tinha sido comido pelos seus “gêmeos maus”, criados pelo remédio.
Sonolência
excessiva e transtorno do sono por turno de trabalho.Não é preciso dizer:
pessoas com insônia não estarão com os olhos brilhando e coradas no dia
seguinte – tanto faz se elas não tiverem dormido, ou se tiverem, em seu corpo,
resíduos de medicamentos para dormir. Na verdade, essas pessoas estão sofrendo
da pouco reconhecida e pouco relatada epidemia da Sonolência Excessiva durante
o Dia. As principais causas da SED são apnéia do sono e narcolepsia. Mas no ano
passado, as corporações farmacêuticas sugeriram uma causa relacionada ao estilo
de vida: “transtorno do sono por turno de trabalho”. Anúncios de Provigil, um
estimulante que trata SED, junto com Nuvigil, mostram um juiz vestindo um
roupão preto, no trabalho, com a frase “lutando para combater o nevoeiro?”.
Obviamente, agentes estimulantes contribuem com a insônia, que contribui com
problemas de sonolência durante o dia, em um tipo de ciclo farmacêutico
perpétuo. De fato, o hábito de tomar medicamentos para insônia e para ficar
alerta é tão comum que ameaça a criação de um novo significado para “AA” –
Adderal e Ambien.
INSÔNIA QUE
É DEPRESSÃO: Disfunções do
sono também deram nova vida aos antidepressivos. Médicos agora prescrevem mais
antidepressivos para insônia que medicamentos para insônia, de acordo com a
CNN. É também comum que eles combinem os dois, já que “insônia e depressão frequentemente ocorrem conjuntamente, mas não fica
claro qual é a causa e qual é o sintoma”. WebMD concorda com o uso das duas
drogas. “Pacientes deprimidos com insônia que são tratados com antidepressivos
e remédios para dormir se saem melhor que aqueles tratados apenas com
antidepressivos”, escreve.
De fato,
muitas das novas doenças de massa, desde DDAH em adultos e AR até fibromialgia
são tratadas com medicamentos novos junto com outros que já existiam e que não
estão funcionando. É uma invenção das corporações polifarmácia. Isso lembra do
dono de loja que diz “eu sei que 50% da minha propaganda é desperdiçada – só
não sei qual 50%”.
–
(*) Martha Rosenberg escreve sobre o impacto das indústrias farmacêuticas, alimentícias e de armamentos na saúde pública.
(*) Martha Rosenberg escreve sobre o impacto das indústrias farmacêuticas, alimentícias e de armamentos na saúde pública.
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